sábado, 25 de julho de 2015

Histórias de Vampiros



Kiang Shi

Para os chineses, o ser humano tinha uma alma superior – hun, e outra inferior – p’o. Os restos mortais, quando intactos, podiam ser tomados integralmente pela parte baixa do ser. Numa reação alquímica com o sol ou a lua, o cadáver era animado de volta à vida – compreensivelmente, com as piores intenções possíveis.
O Kiang Shi é o “Vampiro Chinês” – tem unhas longas e curvas, cabelo cumprido – Muitos kiang shi possuíam longas cabeleiras esverdeadas ou esbranquiçadas, fruto da ação de fungos nos caixões.
Ao Kiang Shi se aplica uma regra de vários tipos de vampiros – o poder de se tomar outras formas que não a sua original em vida. Podendo incluir uma forma humana feminina!

Na China do século nove surgiram duas noivas exatamente iguais em uma cerimônia de casamento. Uma delas era um kiang shi. A noiva verdadeira, subindo nas tamancas, convidou a impostora para resolverem o assunto numa sala adjunta ao salão principal. Má ideia. Quando as duas entraram no recinto fechado, os convidados ouviram um grito horrendo. Acorrendo ao local, descobriram, para terror geral, a noiva morta ao seu lado um assustador pássaro negro, que, voraz, bebia o seu sangue e bicava as suas vísceras.



Extraído de “Super Interessante”, Agosto de 2006

Agora a informação divertida: Para deter um kiang shi, basta um monte de arroz: o vampiro se vê obrigado a contar todos os grãos.

sábado, 18 de julho de 2015

Histórias de Vampiros




Morto duas vezes

O abade Calmet – autor de Dissertations sur les Apparitions des Esprits et sur les Vampires, editado em 1749, abundantemente citado – escreveu também uma enorme História Universal e outras obras importantes. Mas a sua fama se deve mais às crônicas sobre vampiros, através de episódios isolados. Incluía aí divagações médicas, religiosas e filosóficas. Por exemplo, a história do pastor de Blow, na Boêmia (antiga Checoslováquia). Depois de morto, reapareceu e mordeu oito pessoas, que morreram em seguida. Os habitantes da aldeia o desenterraram e o atravessaram com uma lança pontiaguda, mas o vampiro ria e escarnecia dos cidadãos. Resolveram queimá-lo na fogueira, e levaram-no até o local numa carreta. Durante o percurso, o cadáver urrou e se debateu. Novamente traspassado, esvaiu-se numa poça de sangue, antes que o fogo o queimasse totalmente.

Calmet dizia ter sido pessoalmente testemunha de algumas manifestações vampíricas, e de outras havia recolhido testemunhos que ele considerava válidos.



Extraído da edição de setembro de 1973 da revista Planeta.

sábado, 11 de julho de 2015

Histórias de Vampiros



Mamãe Morte

Há muitos anos vivia em Praga, Antiga Checoslováquia, uma mulher que em sua juventude amou um vampiro. Daquela funesta paixão nasceu um totenkind, um filho de tumba. Quando jovem, Petra Vucek era muito bela. Muitos a cortejavam e ela conheceu seu amado durante uma festa ao ar livre. Decidiu que aquele devia ser seu homem. Mas ficou horrorizada quando foi mordida pela primeira vez.
Não poderia fazer outra coisa que abandonar o rapaz. E o fez. Mas já tinha dentro de si a semente de um outro terror, um mal vourdalek ou, para usar a expressão eslava mais comum, um vampirevich – filho de vampiro. Karel Vucek cresceu com sua mãe, que trabalhava para mantê-lo. Parecia um garoto normal, mas Petra sabia que não era verdade e esperava, com angústia, que ele se manifestasse. Passaram-se anos de agonia, antes que o garoto ameaçasse morder. Foi uma menina da mesma idade que Karel, a vítima. Quando Petra soube do fato, não disse nada ao menino. Experimentou quase uma sensação de alívio: finalmente a espera acabara.
Num domingo de agosto, vestiu o filho com a roupinha mais bonita e o levou fora da cidade, numa localidade acima do rio Vltava, muito conhecida dos namorados pelos passeios de barco. Petra alugou um barco.
Quando voltou à margem estava só. Não procurou esconder seu crime, foi presa. Ficou 20 anos na cadeia. No fim da vida, era uma velhinha como tantas outras, mas lembrava bem a sua história e não hesitava em conta-la. Só uma coisa a perturbava: o apelido que lhe deram no bairro onde vivera e que os moleques lhe gritavam: mamãe morte.



Extraído da edição de setembro de 1973 da revista Planeta.

sábado, 4 de julho de 2015

Histórias de Vampiros



A Vingança do Assassinado

Na pequena República de Andorra, quando alguém é assassinado (o que se dá em média uma vez em cada 20 anos), segundo um cerimonial que permanece invariável desde 1200, o magistrado, de toga e capelo, vai até o lugar do delito, seja onde for. Lá dirige-se ao morto, perguntando-lhe três vezes: “Homem, quem te matou? A Justiça o exige”. Ao fim, diz: “O morto não respondeu”.
Até hoje não se sabe qual a origem desse estranho procedimento. Mas o seu mecanismo parece nos revelar que talvez os juízes de Andorra esperem que pelo menos uma vez o morto responda à pergunta.
Em fins do século retrasado houve em Andorra um assassinato. O crime fora praticado com uma pedra e o morto era um pastor de ovelhas. A vítima não apresentava um belo espetáculo aos olhos, com a cabeça esmigalhada. Naturalmente, o morto não estava em condições de responder à pergunta do juiz, que não a fez.
Mas ele morreu odiando, e a lei dos vampiros lhe dava uma possibilidade de retorno.
(Um dos componentes que facilitam o fenômeno vampírico é o ódio. Os homens que tomam conta dos velhos castelos ingleses dizem que os fantasmas são sempre almas de defuntos que em vida odiaram e foram odiados. A regra não varia para os vampiros).
Acontece que o culpado estava numa hospedaria, conversando sobre o misterioso crime, quando viu entrar no estabelecimento um homem que tinha na testa uma lama negra.
Os presentes fugiram e o assassino também, mais depressa do que eles. Mas não se pode fugir de um vampiro.
Os corpos desses seres não respeitam as unidades de tempo e espaço. Na sua desesperada fuga, o matador encontrou-se frente a frente com sua vítima. O terror obriga-o a implorar por misericórdia. Cai de joelhos e continua a gritar, até que uma pedra enorme lhe quebra o crânio. Foram encontrados juntos, num local onde um dos dois não deveria estar.



Extraído da edição de setembro de 1973 da revista Planeta.