terça-feira, 30 de abril de 2013

Alice & Ray - capítulo V

 

“Que tipo de complicações houve?” – Bianca indagou.

“Minha mãe disse que não era mais que uma...”

“Paixonite” – ajudei a Vovô a encontrar a palavra.

“Isso! Que não era mais do que uma paixonite e poderia não ser conveniente...”

“Ah! É sempre assim quando temos essa idade! Minha mãe sempre disse isso de paixonite! Até na época da Vovó era a mesma coisa! Que só quando estivermos mais velhas que vamos saber como é gostar de alguém e blá-blá-blá!” – Bianca comentou em tom de queixa.

“Mas e o porquê de não ser conveniente?” – perguntei.

“Como vocês bem sabem, minha família e eu éramos ligadas à Antiga Religião (Paganismo), à celebração dos Sabás... e tais coisas naquela época eram sempre vistas pelos outros como algo do Mal e todo esse tipo de besteira! Éramos uma família comum e bastante convencional, mas bastaria alguém de fora saber disso e imaginaria que voávamos em vassouras! E naquela época ainda existiam no Reino Unido das ‘leis contra a Bruxaria’, que só foram completamente revogadas, se não me engano, em 1954, e mamãe achava que eu me envolver com Ray poderia, por isso, não ser conveniente”.
 

“Mas te proibiram de continuar vendo o Vovô Ray?” – Bianca perguntou.

“Proibir, não proibiram! Talvez porque imaginavam que ele voltaria para Londres e eu acabaria esquecendo, por se tratar, como pensavam, só uma paixonite. Mas a desaprovação da minha família me entristecia”.

“Acho que sei imaginar! Ficavam falando e falando na sua cabeça! Mas vocês se viram nos dias seguintes?” – Bianca perguntou, ainda esperando o beijo.

“Sim falavam muito, e sim nos vimos nos dias seguintes!”

Vovô fez a expressão de uma gostosa lembrança e continuou:

“Já estava perto do dia dele regressar à Londres, mas na véspera dele partir fomos tomar sorvete e tivemos uma tarde muito gostosa! Conversamos muito, ele me contou histórias divertidas, rimos muito juntos...”.

“Então finalmente o primeiro beijos de vocês!” – Bianca exclamou.

 "Sim! Depois de tomarmos sorvete passeamos a pé, passamos ali pela catedral de Salisbury... Sabe, né, Aline?” – Vovô perguntou evocando minhas lembranças de visitas à cidade.

“Sim, é muito bonito por ali! ^^”.

“Paramos ali e então demos nosso primeiro beijo!”


Continua...

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Alice & Ray - capítulo IV


Vovó continuou nos contando sua história com Vovô Ray:

“Quando deixei que Ray voltasse para Londres acreditando que eu não corresponderia ao seu interesse por mim eu sofri muito! Imaginava o que ele estaria fazendo. Que estaria conhecendo garotas e me esqueceria e quando, e se, voltasse à Salisbury, voltaria já sem pensar em mim, ou até com alguma namorada!”

“Mas a senhora não o perdeu, senão, não estaríamos aqui, né? – Bianca comentou e perguntou:  O que aconteceu?”.

“Depois de um ano Ray voltou à Salisbury, estava de férias do emprego”.

“E aí?” – Bianca perguntou ansiosa.

“Bem, eu o vi, ele estava na frente da casa dos parentes e me olhou sem jeito e com tristeza no olhar, eu o olhei com muita vontade de atravessar a rua correndo para estar com ele, ao mesmo tempo com muito medo dele portar alguma notícia sobre ter se envolvido com alguém e isso acabar com as minhas esperanças, por que, mesmo acreditando que encontraria outra pessoa, depois de todo aquele tempo longe, eu ainda sonhava que ele voltaria para Salisbury e para mim, do mesmo modo que partiu! Ele voltou para dentro da casa, com ar desolado, e eu permaneci na janela, sem coragem de chama-lo ou ir até ele!”

“E aí?” – Bianca tornou a perguntar.

“Nós trocamos olhares nos dias seguintes sem que nos falássemos. Até que um dia eu fui ao mercado à pedido da minha mãe e quando eu voltava encontrei com ele pelo caminho”

“E aí? E aí?” – Bianca estava impaciente.

“Ele se ofereceu para carregar as bolsas. E no caminho ele disse que não deixou de pensar em mim todo aquele tempo e me pediu em namoro! E eu aceitei o namoro!”

“Então rolou o beijo apaixonado que tanto esperaram!” – Bianca disse em tom de comemoração.

“Ainda não! Naquele tempo as coisas eram mais devagar”.

“Bota devagar nisso!” – Bianca exclamou.

“Nós seguimos o caminho de volta para minha casa, andando lado a lado, por vezes eu voltava meu olhar envergonhado para cima, para ele, me sentindo tão feliz! Em frente de casa, já, ele segurou minhas mãos! Ele me olhava de um modo muito doce e seus olhos brilhavam, me dizendo que ele também estava muito feliz! Depois disso eu entrei e fui para o meu quarto, deitei na minha cama e fiquei lá sonhando com o futuro!”

“Aí no encontro seguinte teve beijo e começaram o namoro?”
– Bianca perguntou.

“Não, na verdade. As coisas complicaram um pouco!”.

Continua...

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Alice & Ray - capítulo III


Vovó começou a nos falar sobre o Vovô e como se conheceram.

“Raymond tinha acabado de prestar serviço militar...”.

“Vovô diz que ‘escapou de duas guerras” – comentou a Bianca.

“Sim, ele entrou para o exercito no ano seguinte ao fim da Segunda Guerra e completou o tempo de serviço um ano antes da guerra da Coreia da qual a Grã Bretanha participou. E nesse ano em que deixou o exercito que ele foi à Salisbury visitar parentes, e foi então que nos conhecemos.”

“Mas se o vovô tivesse participado da guerra ele seria tipo os caras dos Bastardos Inglórios!” – comentou Bianca empolgada.

Expliquei à Vovó quem seriam os tais Bastardos Inglórios. Vovó se divertiu e comentou rindo: “O inimigo teve sorte, então, de escapar do Ray!”.

“Mas o vovô era gato?” – quis saber Bianca.

“Sim, Ray era muito bonito! Eu achava chique ele ser de Londres! E ele era muito doce, diferente dos demais!”

“E como se conheceram?”
– Bianca perguntou.

“Os parentes dele moravam quase de frente à minha casa e como ele estava naqueles dias lá passamos a nos ver e ele sempre me comprimentava e puxava assunto. Ray diz que se encantou comigo tão logo me viu pela primeira vez...”.
“Mas eu demorei a perceber que ele estivesse interessado em mim! Ele era mais velho, bonito... e eu só tinha catorze... Quando percebi que ele estava me paquerando eu me senti muito envaidecida”.

“Até que ele se declarou?”
– Bianca perguntou com expectativa.

“Sim, ele se declarou, mas eu o desiludi!”

“=| Por quê? Se a senhora já gostava dele!” – Bianca perguntou.

“Eu era muito tímida, me sentia assustada! Eram outros tempos”.
“E logo ele voltou para Londres! Depois que ele partiu eu fiquei muito triste, pois eu o tirara as esperanças! Eu imaginava que o perderia para sempre!”



Continua...

***

A “Novela Alice & Ray” volta na segunda-feira!


E hoje é aniversário da Bianca!
Agora já é dezesseis e não mais “quase/praticamente dezesseis”, como nos falava no fim de semana passado!
Parabéns, Bia!
Feliz Aniversário!
Eu te amo muito!
Você é a melhor prima que se pode ter!

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Alice & Ray - capítulo II


Vovó começou a falar sobre o “new look” para Bianca:

“A grife Dior que lançou a moda “new look”, tinha o tailleur Bar, com casaqueto de cintura fina, arredondado e lembrava uma tulipa, saia ampla e na altura dos tornozelos... rs... Isso me lembra de algo engraçado! Ray dizia que eu tinha as mãos bonitas! Eu imaginava se ele não estaria... como vocês dizem mesmo?”.

“De caô” – Bianca respondeu.

“É! ...se ele não estaria ‘de caô’, ou se era tímido, e no fundo queria elogiar meus tornozelos! Naquela época os meninos viviam de olho nos tornozelos! Mas o Ray realmente achava as minhas mãos bonitas... e os tornozelos também!”
(risos)

“Mas voltando à moda também vieram os chapéus, luvas, acessórios luxuosos! Lembro-me de querer ‘reformar’ vestidos meus, e ficava uma tragédia!”

(risos)

“E as maquiagens, vó?” – perguntei.

“Maquiagem também estava em alta! Especialmente para valorizar o olhar! Sombras, rímel, lápis para olhos e sobrancelhas e principalmente delineador! ...Claro, fazíamos desenhos de delineador diferentes dos que você fazia algum tempo atrás!” – disse brincando com o modo que eu me maquiava uns anos atrás. (<< foto)

(mais risos)



“As mulheres estavam se tornando mais glamorosas e femininas! Com o fim da guerra em 1945 (Segunda Guerra Mundial) acabou o racionamento de tecidos e a escassez de cosméticos”.

“Conta pra gente como era o vovô e como vocês se conheceram!” – Bianca disse ansiosa.

“Vou contar!” – respondeu a vovó Alice.

Continua...

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Alice & Ray - capítulo I


Vovó Alice se acomodou na poltrona para nos contar sua história com vovô Raymond.

“Quando Ray e eu nos conhecemos eu tinha catorze anos, e começamos a namorar quando eu tinha a sua idade, Bia, quinze anos”.

“Quer dizer mais nova que eu, vó! Eu tenho quase dezesseis!”

Olhamos para Bianca.

“Meu aniversário é sexta, dia vinte e seis, falta menos de uma semana! Já é praticamente dezesseis!” (...) “Mas, Vó, a senhora então tinha catorze quando conheceu o vovô Raymond? Então ele foi seu único namorado? Nuss, que fofo! E... Nuss! Estão vendo? Pode acontecer do Marcus e eu continuarmos juntos até bem velhinhos, que nem a vovó Alice e o vovô Raymond! *----*”

Vovó fez aquela expressão de quem vai buscar as memórias e começou a nos contar.

“Bem, como eu já disse, eu morava em Salisbury (Inglaterra), eu tinha catorze anos e estávamos nos final dos anos 40...”.

“E quem era o Justin Bieber da época? Quero dizer, quem era o cantor que era ídolo na época?” – perguntou Bianca.

“Eu gostava do Sinatra. Em meados daquela década ele era um ídolo, era ídolo das ‘bobby boxers’, como eram chamadas as jovens fãs do ritmo musical “swing”! Eu gostava muito de ouvi-lo. Também gostava das grandes orquestras”.

“Frank Sinatra, Bia. Aquele cantor antigo que gravou um dueto com o Bono do U2, que comentei com você.” – acrescentei a informação.

“Bobby boxers! Era, então, tipo uma tribo!” – comentou Bianca.

“Eu escutava muito o rádio, todos ouviam muito rádio, televisão era coisa que viria nos anos seguintes... Eu ficava imaginando que quando me apaixonasse dançaria com o amado ao som das orquestras e eu usaria um lindo vestido feito de metros e metros de tecido, bem amplo, fino na cintura e na altura dos tornozelos, como eram os vestidos no estilo “new look Dior”!”.

“Até que apareceu o vovô Raymond para ser eu par!” – comentou a Bianca “Mas, vó, o que era isso de ‘new look Dior’?”.

Continua...

terça-feira, 23 de abril de 2013

Alice & Ray - Prólogo

Nesse final de semana passado próximo fomos meus pais, Rafael e eu visitar minha avó Alice. Meus tios e primos, como de costume, também estiveram por lá e tivemos bons momentos em família, como conversar sobre música com o tio Beto, assistir, depois de tempos, a um jogo de futebol com papai...
Mas um momento que merece especial anotação em meu diário foi uma conversa muito gostosa que vovó Alice teve com minha prima Bianca e eu.

Bianca me falava de seu descontentamento com a possibilidade da família do namorado se mudar para uma cidade vizinha à deles. Afinal estão acostumados a se verem todos os dias e a estudarem na mesma escola e com a possibilidade do contato passar a ser semanal além de diminuir o tempo junto já rola também aquele ciúme!

Eu lhe disse que, de qualquer forma ainda era só uma possibilidade, mas no caso de mudarem não será nenhuma catástrofe, podendo até ser bom pra dar aquela saudade, que “todo dia junto” também pode acabar dando mais briga e que esperando pelos finais de semana não dá pra desperdiçar o tempo junto brigando e... Epa! Eu estava falando parecido com a minha mãe! =|

Foi quando vovó se aproximou, trazendo um dos deliciosos “doces de abobora da vovó” e quis se inteirar do assunto que estávamos conversando.

“É que pode ser que o namorado da Bia se mude para Araruama e ela tá descontente de deixar de vê-lo todo dia, e com medo que o namoro se enfraqueça” – respondi à vovó.

“Ah, Bia, mas Araruama nem é tão longe de Saquarema, e, sabe, se o que vocês sentem for, como dizem, “pra valer”, não irá se enfraquecer por isso!” - comentou a vovó.

Vovó sabe das coisas. Bia ergueu as sobrancelhas e esperou pela próxima frase, afinal vovó não é de dizer uma máxima e sair sem se ater mais ao assunto. Logo vovó continuou:

Sabe, quando seu avô Raymond e eu começamos a namorar morávamos em cidades vizinhas, ele em Londres, e eu em Salisbury. Ele ia me ver nos finais de semana... Mas vocês não iriam querer saber das histórias dessa velha, coisas de outros tempos, não é?”

Vovó é de fazer esses charmes, mas quer contar a história!

“Claro que queremos saber mais da sua história com o vovô! Não é mesmo, Bia?”

Bia consentiu agitadamente com a cabeça que sim.


Continua...

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Histórias de Terror Assustador que dão Medo!



Protegida por morros cobertos por mata atlântica e dona de uma beleza paradisíaca, a “Prainha” no Rio de Janeiro é uma pequena praia, como já sugere o nome, com 700m de extensão, tem manancial de água doce e possui areias claras e águas cristalinas próprias para o banho graças às correntes favoráveis e ao verde de duas unidades de conservação que as protege. Com boas ondas é uma das praias mais procuradas para a prática de surfe. No Parque da Prainha há o Museu do Surfe, trilhas ecológicas, banheiros públicos e duchas para banhistas. Tudo isso faz da Prainha uma boa opção de destino... durante o dia!


Era uma noite de sexta-feira, quando um par de faróis, trilhando a Avenida Estado da Guanabara, único acesso à Prainha, no sentido Recreio-Prainha, era a única luz na escuridão da madrugada no local sem iluminação pública. Dentro do veículo havia um casal de namorados, que pretendiam ter uma ardente noite de amor na praia que durante a madrugada se torna um local deserto e isolado.

O rapaz estacionou o carro à entrada do estacionamento da praia e o casal desceu de mãos dadas até o meio da faixa de areia. Olharam o céu estrelado e começaram a trocar carícias fogosas e beijos.

Até que a moça sentindo a estranha sensação de não estarem sozinhos abriu os olhos no meio de um longo beijo, e teve uma visão que a fez gritar apavorada. O rapaz se assustou com o grito alto e agudo, soltando a namorada automaticamente – O que houve? – perguntou o rapaz. – Eu vi um homem, um homem horrível! Bem ao nosso lado, bem perto e me olhava fixamente! – Ela respondeu, e seguiu descrevendo o tal homem – Ele era horrível, coberto de feridas e manchas, seu rosto era deformado, tinha o nariz achatado.

E cadê ele? Como sumiu tão rápido? Você não imaginou isso por estar com medo? – perguntou o namorado. – Não! Eu vi! Vi nitidamente! Eu quero ir embora! Estou com medo! Não estou me sentindo bem aqui! – ela respondeu e ele retrucou – Deve ser algum mendigo que vagou até aqui. Deixa de besteira!
Mas concordou em subir com ela de volta até o carro.

Quando subiram de volta à pista a luz da lanterna do vigia do parque da praia veio de encontro às suas vistas lhes ofuscando por segundos. Cobrindo os rostos avistaram o vigia que lhes perguntou – O que vocês fazem aqui essa hora?

Sem jeito e um pouco preocupado o rapaz respondeu que queriam – aproveitar a praia deserta à noite – o que foi suficiente para que o vigia entendesse.

Vocês teriam muitos lugares melhores para isso, não aqui, não nessa hora! – disse o vigia. – Eu me assustei com um homem, um homem horrível, Senhor Vigia! – disse a moça, seguida pelo namorado – Deve ser algum mendigo perambulando, eu disse pra ela, acho que devíamos ir lá procura-lo. Mas o vigia respondeu – Eu não desço nessa praia à noite! O que ela viu, não é desse mundo! Quem anda por aqui à noite vê coisas! Coisas estranhas. Essa praia foi um leprosário, aqui, muitos leprosos tiveram seus últimos dias, suas almas agonizantes passeiam à noite!

Isso é uma grande bobagem! Não existe isso de “coisa do outro mundo” e almas penadas! Mas, bem, se não quer vir eu vou lá sozinho e vou encontrar esse mendigo que a assustou – explodiu o rapaz, decidido a dar uns tabefes no suposto mendigo, e desceu para a areia. – Ele está fazendo uma grande besteira – disse o vigia à moça – Eles, os leprosos, provavelmente não o deixarão voltar! – completou.

O vigia e a garota ouviram a voz do rapaz gritando apavorado lá em baixo na areia e os gritos de “Não! Não! Não! Não!” cessarem após alguns minutos.
Nunca mais o rapaz foi visto nem foram encontrados vestígios dele.
Foi arrastado para o Além!


Nota: Sobre a Prainha ter sido um “leprosário” é apenas algo que os surfistas gostavam de espalhar nos anos 60 e 70 na tentativa de manter a praia isolada. Mas espero que você tenha gostado do conto.


...beijinhos***

quinta-feira, 4 de abril de 2013

"Meu Velho"


Final de semana passado, em casa, já deitada e bem aconchegada, pronta para dormir percebo um senhor se aproximar da porta do quarto. Ele me observa com carinho e zelo por alguns instantes, e sai à passos leves. É um “velho conhecido meu”, o mesmo que quando cheguei em casa, depois de mais uma semana no campus, me recebera com um gostoso abraço. Sorri ao ver que ainda repete a mesma “espiadinha”. Imaginei quantas vezes foi uma espiadinha zelosa dessas, e me ver ali deitada dormindo, algumas vezes com um ursinho ao lado, que lhe deu animo para sair para mais um dos muitos plantões noturnos de seu trabalho. Lembrei-me de que, naquele mesmo quarto, quando dormir lá sozinha na cama ainda era uma novidade, ele se sentava ao pé da cama prometendo ficar até que eu pegasse no sono.
Conhecendo bem este senhor, como conheço, imagino como foi difícil para ele “ser a figura severa” no cumprimento da tarefa de me educar e preparar para a vida, o que, na verdade, foram bem poucas vezes. Não que as “bagunças” tenham sido poucas e sim porque este senhor é “manteiga”.  Também conhecendo bem esse senhor, pensei nas vezes em que, certamente, sentiu ciúmes do meu carinho por meu tio Beto.
Pensei como foi para ele aturar uma adolescente! Imaginei como foi para ele reconhecer os primeiros sinais de que “sua menininha” estava crescendo. Já não precisando dele à beira da cama para dormir ou não se interessando em “ajudar” a lavar o carro, vestindo biquininho e brincando com a água... Como deve ter sido para ele deixar de ser “meu super-herói” e passar a ser “velho” (mas com funções de chofer, caixa-forte...), perdendo para grupos de amigos a sua condição de prioridade para mim. Mas se estava destituído do posto de primazia, eu ao contrário não perdia o posto. Ele sempre esteve e está lá para qualquer solicitação, para qualquer necessidade... Imaginei quantas vezes esperou por longo tempo que, em meio a tantas atividades com a turma, eu encontrasse um momento para, como quando pequena, sentar junto a ele para assistir a algo na TV, em especial a jogos de futebol. (É, sem meninos, sempre se esforçou em cultivar em mim o ser torcedora)
Imaginei como foram os ciúmes, agora não mais de mim com seu irmão, mas ‘pior’ das minhas primeiras paquerinhas e namoradinhos... Imaginei o tamanho da sua vontade de me superproteger... Sua preocupação em todas as vezes em que eu não estava (e continua ainda quando não estou) ali deitada para ser espiada e sim nas baladinhas com as amigas (e pior podendo haver “gaviões” me rondando)...
Imaginei como é para ele me olhar e ver uma jovem mulher, isso é, se é que para ele eu já tenha deixado de ser “sua menininha”! Bem, já sobre deixar de vê-lo como “‘super-herói’, rebaixando-o a ‘velho’”, já não é “um velho”, é “meu velho” e com certeza um herói, não infalível como o “super-homem”, mas um herói humano com seus erros e acertos, mas que invariavelmente se esforça muito pelo melhor para “sua menina” e é o dono do abraço com beijo de barba espetando mais gostoso do mundo, um abraço que termina não com o fim de sua vontade de permanecer abraçado, mas com a timidez e é seguido do olhar amoroso que dispensa a necessidade da frase “como estou feliz por você estar aqui”!
E por tudo isso, e muito mais, é que é tão bom poder estar aqui hoje para lhe dar um longo abraço e dizer “Feliz aniversário, Papai!” (para os demais “Dr. Olavo”)

...beijinhos***